Carta às mulheres que continuam com homens execráveis
celiacloureiro
Isto não é um apelo feminista: é um apelo à integridade física e psicológica de um estrato social que são as mulheres, e é dirigido às que vivem relações tóxicas com homens que deviam estar internados em alas psiquiátricas, e que ameaçavam levá-las a elas à loucura – ou à morgue.
Há vários argumentos para uma mulher não deixar um homem execrável: um deles é que é pai dos seus filhos, e não quer que os filhos cresçam sem pai. Aqui talvez devamos atentar na definição de pai. Um pai não é o tipo que entrega uns trocos para as compras da casa, nem quem paga metade da creche, nem quem oferece um brinquedo aos miúdos no Natal. Há tipos que são pais sem um tostão no bolso, mas que tiram prazer da companhia dos filhos, que agem com cada pensamento direcionado ao melhor das crianças. Depois há tipos para quem estar com os filhos é um frete, um cansaço evitável, um aborrecimento de fim-de-semana. Os filhos como fardo, e o pretenso pai a destruir um fim-de-semana de amigos e copos por causa dos putos.
Para mim um pai é quem ama os filhos, quem os põe à frente de si próprio, quem canaliza para eles (e para o seu bem-estar) os recursos necessários para que possam crescer saudáveis e felizes. E atenção que os miúdos não precisam de muito para serem felizes.
Esclarecida a definição de pai, uma mulher, sobretudo se uma que trabalha, não precisa de aguentar uma relação abusiva por causa dos filhos – pelo contrário, se o pai maltrata a mãe, física ou psicologicamente, se lhe destrói a paz e a autoconfiança – priva-a da força necessária para cuidar das crianças. E as crianças, acreditem, não querem pais que maltratem as mães. Por muito que esses pais tenham os bolsos cheios de rebuçados flocos de neve.
Quando o homem aterroriza a mulher com ameaças, com mensagens que talvez pudessem encontrar até um enquadramento penal, com ofensas, com boçalidades que traduzem – resumidamente – que ele na realidade é uma besta, a mulher deve fechar a porta. Porque é que algumas mulheres são maltratadas – humilhadas, espezinhadas – por este tipo de homem doente, e não fecham a porta? Algumas não conseguem fazê-lo – porque ele as ameaça e persegue, por exemplo. Mas outros têm um bocadinho de respeito às autoridades e, sobretudo, querem preservar a imagem de santo perante a família e os amigos (em suma: esconder que são, afinal, a tal besta), e até as deixariam ir em paz. Isto é, durante alguns dias, ou semanas, podem até mentir, dar a entender que daqui por diante vão ser melhores. A mulher tem é de compreender que esses homens não têm melhor – aquilo são eles a nu, e depois de mostrarem a sua verdadeira natureza não há como varrê-la para detrás da máscara do cordeirinho de início de namoro.
E algumas mulheres deixam mais depressa um homem que as traia do que um homem que as maltrate. Porquê?
Uma relação tóxica destrói a mulher, destrói a família, destrói a conceção de família e relacionamento saudável para as crianças. Suga a alegria, a espontaneidade, os momentos bons de que as vidas devem ser férteis. Torna-se uma relação de interdependência que os destrói a ambos – um porque a alma apodrece ao fazer mal, outro porque a sensibilidade se estilhaça ao ser vítima de agressões gratuitas de alguém a quem, a todo o momento, se procura agradar. Espero que essas mulheres encontrem forças para se livrarem dos homens execráveis: acordem um dia e entendam que são mais, que merecem mais, e que o problema é que esses homens não sabem amar, não saber pôr-se no lugar dos outros, não querem construir nada nem sequer providenciar vidas melhores aos filhos que dão diligentemente andam por aí a fazer. Atenção: claro que têm o seu lado charmoso (manipulador), ou são bonitos, ou ótimos a fingir-se de arrependidos. Não caiam em nenhuma dessas tretas.
O feminismo fundamentalista dos anos 60 e 70 apregoava mulheres de pêlo no sovaco e que não precisavam de homens para alcançar sucesso. O feminismo de hoje em dia, mais consciente, sabe que o que importa é a felicidade da mulher. Que a mulher se cumpra psicologicamente, sexualmente, socialmente, e também, se o desejar, na maternidade e nos relacionamentos amorosos. O que não entendo é como é que algumas dessas mulheres de hoje, que sofrem nas mãos de homens abjetos, ainda não entenderam a verdade absoluta por detrás do famoso “antes só do que mal-acompanhada”.
Libertem-se! Os vossos pais não vos criaram para isto. Ou, se os vossos pais também viviam relações doentes, como não registaram o exemplo como um a não repetir? Libertem-se! Os vossos filhos não têm de levar com os danos colaterais da vossa relação apodrecida. Libertem-se! Merecem mais, merecem melhor. Nunca se rebaixem. À primeira ofensa, partam para outra. Há homens que avançam sobre a boa-vontade de uma mulher até a transformarem num caco, num ser humano que se auto-anula, num trapo velho. Libertem-se! Estamos convosco.